Agencia Prensa Rural
Mapa do site
Suscríbete a servicioprensarural

Sejamos sérios, Santos
“O Presidente, com sua suspensão, derrubou o tabuleiro onde jogávamos a partida, destruiu a confiança. As coisas não poderão reiniciar-se assim, sem mais nem menos, haverá que fazer diversas considerações”.
Rodrigo Londoño Echeverri / sexta-feira 28 de novembro de 2014 / Español
 

O Presidente emprega de mil maneiras a bandeira da solução civilizada ao conflito armado. Manifesta sua devoção por figurar na história como o homem que conseguiu a paz. Repreende, inclusive, os declarados defensores da solução militar. Pactua com a insurgência uma Agenda sobre a qual realizar conversações definitivas. Se ufana dos avanços alcançados e fala de perseverar. Até promove no exterior o pós conflito.

No entanto, sua atitude e seus feitos resultam muito mais reveladores que suas palavras. Só uma ideia parece obcecá-lo, render a insurgência, obrigá-la ao desarmamento, a entrega e a desmobilização. É o único resultado que para ele cabe assimilar com a paz. A Mesa de Havana se revela assim para o governo nacional como o cenário que facilitará a mecânica ordenada da admissão de sua derrota por parte da guerrilha das FARC-EP.

Não o expressam abertamente, porém a estas alturas resulta impossível ocultá-lo. A passagem do tempo, como as correntes, vai revelando o que se esconde sob a água. Basta examinar a conduta e as palavras tanto do Presidente Santos como do senhor De La Calle com relação aos dois casos mais recentes do acionar das FARC em Arauca, com os dois soldados, e no Chocó com o general, para descartar qualquer dúvida a respeito.

O Presidente sempre fanfarronou com o slogan israelense de dialogar como se não houvesse guerra e fazer a guerra como se não houvesse diálogos. Negociar em meio ao conflito tem sido sua posição permanente desde as primeiras aproximações. As regras do jogo que sempre reclamou foram as que nada do que ocorrera nos campos de batalha teria por que afetar o curso das conversações. Impôs inclusive que as conversações de Havana fossem ininterruptas.

Assim ficaram excluídas de entrada no Acordo Geral as possibilidades de congelamentos ou suspensões. O qual não excluiu seu direito a ordenar ao alto mando militar, pelo menos uma ou duas vezes por semana em seus discursos, recrudescer com toda sua força e poder contra as FARC. O Presidente nunca cessou de proclamar-se como o primeiro inimigo nosso, o que mais nos golpeou, o que conseguiu matar meia centena de mandos de todas as categorias.

Assim que nada podia argumentar contra o acionar militar das FARC contra unidades do Exército Nacional, em exercício de suas atividades de guerra e em suas áreas de operações. Porém decidiu fazê-lo, ordenando a suspensão do processo e violando em forma flagrante não só sua própria retórica como também os termos do Acordo Geral. A guerra vale e é aplaudida se provém do Estado, porém se torna condenável se é realizada pelo adversário atacado. A lei do funil.

Pôr como condição para reiniciar um processo suspenso arbitrariamente que a contraparte faça rápida entrega de seus prisioneiros equivale a um sequestro do processo de paz pelo Presidente. E responder, como tem feito a seus críticos, que põem ênfase na importância de combinar um cessar bilateral de fogos para evitar esse tipo de sobressaltos, põe de manifesto que o processo de paz não é mais que um simples instrumento numa estratégia final de guerra.

À resposta afirmativa das FARC que marca, sem dúvida, uma etapa em nosso modo de atuar nesse tipo de situações, o governo nacional corresponde com uma irracionalidade absoluta. Nossos porta-vozes em Havana se reuniram com os enviados de Santos e os garantidores, num gesto que muito poucos avaliam se se tem em conta a suspensão unilateral dos diálogos pelo governo, e de maneira ágil combinaram procedimentos e protocolos para as libertações.

Porém, o governo dispôs paralelamente uma operação militar sem precedentes, que não se detém nem sequer para possibilitar a realização do pactuado entre as duas partes. A militarização do Atrato, os sobrevoos, bombardeios e metralhamentos crescem em ferocidade. Se insiste num resgate pela força, talvez em precipitar uma desgraça que ninguém deseja. Essa é a verdadeira catadura do regime. Não há que chamar-se a mentiras, Santos joga ao mesmo.

Como sucede com a Mesa e o Processo, Santos pactua os protocolos, porém insiste em arrebatar pela força os prisioneiros, obstaculizando objetivamente o cumprimento daqueles. Quer dizer, viola novamente o pactuado. A realidade transbordou as regras do jogo defendidas pelo governo. O Presidente, com sua suspensão, derrubou o tabuleiro onde jogávamos a partida, destruiu a confiança. As coisas não poderão reiniciar-se assim, sem mais nem menos, haverá que fazer diversas considerações.

Que difícil, quão complicado resulta fazer ao Estado colombiano, ao seu governo, as classes no poder compreenderem que o conflito de meio século ao qual buscamos pôr fim com este processo se explica por umas causas que o originaram e o sustentam. E que, entre essas causas, colocando um pouco de lado a iniquidade e as injustiças galopantes no país, a mais destacável é intolerância política, a perseguição declarada contra os que propõem alternativas diferentes ao regime.

A violência oficial, por via militar, policial ou paramilitar, se encontra na base do nosso levantamento armado. Estamos convencidos de que esta guerra não se teria produzido jamais se o crime e a perseguição não se houvessem enfurecido sistematicamente contra os representantes da oposição ao regime oligárquico. Foi tanta e tão reiterada a intenção oficial de aniquilar a inconformidade que se tornou legítimo apelar ao recurso das armas para fazer política.

Ali centramos as FARC o núcleo do processo de paz. Desmontemos todas as formas de violência política em nosso país. A oficial e a insurgente. Reconheçamos as responsabilidades que cabem a elas, ante o mundo, a nação e as vítimas. Façamos até o impossível por ressarcir a estas últimas. Porém abramos definitivamente as portas ao exercício da oposição política a todas as correntes, com plenas garantias, sem excluir a ninguém, pacífica e legalmente.

Ainda no dia de hoje voltam a insistir-nos em mostras de paz, em gestos contundentes que demonstrem nossa vontade de reconciliação. Como se fora pouca coisa ter recebido o enviado do Presidente, depois que [este] nos insulta publicamente e suspende o processo de paz em violação aberta ao acordado. Como se não valesse nada ter continuado conversando apesar, do Presidente ter ordenado o assassinato de nosso Comandante Alfonso Cano
Gestos de paz. O que se torna insustentável é que o Presidente continue se ufanando de matar e matar, enquanto opera com histeria porque se lhe responde com dignidade. Sejamos sérios, Santos.

TIMOLEÓN JIMENEZ
COMANDANTE DO ESTADO-MAIOR CENTRAL DAS FARC-EP
Montanhas de Colômbia, novembro de 2014.